NORMAS TÉCNICAS PODEM TER PESO ÉTICO, CONTRATUAL OU LEGAL

Nunca as normas técnicas da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) foram tão valorizadas quanto no momento atual. Os motivos para isso, e o valor que elas possuem no campo do Direito, foram os temas abordados pelo advogado Carlos Delmar, no Encontro Nacional de Fabricantes e Revendedores de Kits para Vidraceiros e Serralheiros (Enakit), realizado no fim do ano passado em São Paulo.

Para Delmar, existe ainda desinformação por parte dos que pensam que as normas são apenas uma recomendação técnica. Segundo o advogado, a obrigatoriedade das normas técnicas decorre de três fatores básicos: dever ético-profissional, dever contratual e dever legal.

DEVER ÉTICO-PROFISSIONAL

O palestrante do Enakit destacou que os vidraceiros, como profissionais de área técnica, têm o dever ético de aplicar as normas técnicas em tudo que oferecem e executam. Também engenheiros e arquitetos possuem esse dever, que é previsto nos textos que descrevem as obrigações e deveres dos profissionais engenheiros e arquitetos, elaborados pelos conselhos que representam tais categorias.

DEVER CONTRATUAL

O dever contratual dos fornecedores existe sempre e em todos os casos. Ele defende que quem compra um produto pressupõe que aquele produto esteja de acordo com as boas normas. “E esse é um direito da boa-fé objetiva, pois quem compra um produto ou contrata um serviço espera que estes atendam aos requisitos mínimos de qualidade que, no caso, são determinados pelas normas técnicas”, explica.

Delmar cita que no campo civil um artigo prevê que, quando se está concluindo uma construção ou reforma, o contratante ou dono da obra é obrigado a recebê-la. Entretanto, poderá rejeitá-la se o empreiteiro ou construtor se afastou das instruções recebidas e dos planos dados, que é o projeto, ou das instruções técnicas de trabalho de tal natureza — que nesse caso são as normas técnicas. “Ou seja, o dono da obra poderá rejeitar o trabalho se o construtor entregá-la em desacordo com as normas técnicas ou, ao invés de rejeitá-la, recebê-la com abatimento no preço em valor equivalente ao custo de adequar tal obra ao que determina as normas técnicas”. E se tal construtor, após indenizar o dono da obra, quiser reaver a perda e punir o fornecedor responsável pelo não cumprimento da norma, poderá fazê-lo, processando o fornecedor responsável, que pode, inclusive, ser uma fabricante de kit, um vidraceiro ou um serralheiro.

DEVER LEGAL

Existem diversas leis que determinam o cumprimento das normas técnicas. Um exemplo são os diversos códigos de obras municipais, estaduais ou municipais. Eles determinam o regime obrigatório de normas técnicas nos contratos de obras ou serviços. Também na questão de cumprimento das leis de acessibilidade, que determinam o cumprimento da Norma de Acessibilidade (NBR 9050) na construção de rampas, altura de corrimãos e outras questões técnicas.

Na questão da relação com o consumidor, o artigo 39 do Código de Defesa do Consumidor estabelece que é vedado ao fornecedor de produtos e serviços colocar no mercado de consumo qualquer produto ou serviço em desacordo com as normas expedidas pelos órgãos oficiais competentes ou, se essas normas não existirem, pela ABNT ou outra entidade credenciada pelo comércio. “Então a norma técnica não é lei, mas tem que ser cumprida porque vem uma lei que estabelece essa obrigatoriedade”, descreve Delmar.

O advogado e palestrante cita que o procurador Roberto Irineu Tardelli menciona o seguinte em uma reportagem: “Quem estiver dizendo que uma norma técnica não precisa ser cumprida — ou seja, que ela é voluntária — está dizendo uma séria tolice, uma estupidez. É uma afirmação inconsequente, leviana e muito perigosa. Fujam de quem afirma esta bobagem. Quando se descumpre uma norma, assume-se, de imediato, um risco. Isso significa dizer que o risco foi assumido. Ou seja, significa que se está consciente do resultado lesivo”.

RESSALVAS

Atenuantes e ressalvas estão no fato de que existem mais de 8 mil normas, incluindo de procedimento, de especificação e padronização. São normas de várias naturezas, sendo algumas conflitantes e outras com redação deficiente. “Devido a isso, as normas não são isentas de contestação, sendo que o conflito de normas se resolve dentro do campo técnico, que pode incluir testes.

“Quem estiver dizendo que uma norma técnica não precisa ser cumprida, ou seja, que ela é voluntária, está dizendo uma sandice, uma estupidez. É uma afirmação inconsequente, leviana e muito perigosa. Fujam de quem afirma esta bobagem.”
Entrevista: Procurador Roberto Irineu Tardelli

NORMA DE DESEMPENHO

Não cumpir normas técnicas é crime!

Sobre a Norma de Desempenho (NBR 15.575) Delmar, que publicou um livro sobre o assunto, destaca: “Ela estabelece ocorrências do projetista, do usuário, requisitos mínimos quando em uso, estabelece prazos de vida útil dos sistemas construtivos, prazos de garantia, realização de manutenção, e define quem vai realizar as manutenções e os métodos de ensaio. Tudo isso é muito importante porque, nas discussões jurídicas com as antigas normas, se tinha uma subjetividade, mas a 15575 não deixa margem para dúvidas”.

Falando sobre a lógica da Norma de Desempenho, Delmar explica que ela estabelece que as construções de qualidade precisam ser compostas pelos seguintes pontos: bom projeto; boa execução; produtos com vida útil condizente e bom uso, que inclui a utilização sem excessos e a realização de manutenções periódicas.

MANUAIS GANHAM IMPORTÂNCIA

No caso do vidro exemplifica que um boxe ou uma fachada deve ter vida útil de 20 anos. O fornecedor vidraceiro ou serralheiro precisa utilizar materiais adequados que possam resistir o máximo possível para se chegar a esse objetivo. Devido a isso, o fornecedor deve fornecer manual orientando aos usuários a como proceder para que essa vida útil seja alcançada. No manual deve constar qual a correta utilização do produto e quais as manutenções periódicas são necessárias para isso, incluindo a substituição de peças de acordo com a orientação dos fornecedores. Fazendo isso poderá se livrar de processos futuros. T&V

 

 

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